O mito santomense da salvação individual pela educação – episódio 4

País -
educação

Ivanick Lopandza - Mestre em Economia Aplicada à Gestão

Todos assistimos à decadência da nossa sociedade, uma queda brusca que promete arrastar tudo e todos. Muitos assistem aos vícios do sistema sócio-económico na expectativa que individualmente sejam recompensados.

A tese que os antigos usavam era de que precisávamos estudar. A tese funcionou enquanto a educação continuava a ser a razão da distinção de classe entre os santomenses. Enquanto o nível de estudo continuava a ser uma raridade, um selo de classe média e abastada santomense.

Porém, as coisas mudaram. O ensino se populariza, todos conseguem estudar e têm mais opções de estudo. A classe média e a abastada criam um outro fator de distinção: ensino privado a um preço que afasta os menos abastados. Essas escolas tornam-se um viveiro de conexões entre os filhos do poder e da nova classe média que lhes quer assemelhar. Os pais se matam para colocar a criança no jardim em aulas de natação, línguas estrangeiras, balé, etc… na expectativa que ganhe uma vantagem sobre os demais.

Em outras palavras, temos uma escola para o pobre e uma outra para o burguês. Em uma escola as aulas de informática não possuem computadores, senta-se às janelas, não possui manuais escolares e as turmas sofrem com uma sobrelotação de até 80 alunos e nenhuma ventoinha muitas vezes. No outro canto, tem-se professores de ponta, turmas vazias, manuais de primeira e muito mais.

Nessa senda, pode-se ir mais fundo ainda. As escolas criam um senso artificial de classe entre os jovens que se distanciam um dos outros a partir do local onde vêm. Até as linguagens e os símbolos são diferentes. As escolas estão a criar santomenses diferentes, que já alienados, não têm nada em comum, a base de toda essa diferença é económica, é o que permite o acesso a partir do dinheiro!

Pode-se pegar como exemplo o novo surto de coronavírus. Os alunos pobres aproveitam a quarentena para ajudar os pais trabalhando no mercado e outras peripécias, ou o vírus ou a fome. Eles não têm capacidade de fazer estoque. Já os mais abastados, vivem em redes sociais sofrendo de ansiedade sobre o que acontece na Itália e outros países, quando não, esvaziam as prateleiras por serem os únicos com a capacidade de poupança ou mesmo de endividamento. Os burgueses têm tudo a perder, os pobres já sofrem do vírus do desprezo, da negação e da invisibilidade!

Quando se entende porque a qualidade dos alunos vem caindo, percebe-se logo que os alunos despertaram: não acreditam mais no mito da salvação pela educação, sabe que não serve para nada. Olham a sua volta, os mais inteligentes fugiram da ilha ou andam desempregados ou doidos pela praça.

Um dia eles ficarão violentos, muito violentos… e um dia, nós os “muito educados”, exigeremos deles a educação que não tivemos o bom senso de dar… na ausência de educação curricular, eles foram educados por cantores drogados, gangsters norte-americanos e modelos seminuas… faltam-lhes arte que elitizamos para nos gabar em bares o quão somos inteligentes!

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Até o proximo episódio.

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