PCD acusa PGR de “perseguição pessoal” ao ex-presidente da Assembleia Delfim Neves

“Trata-se de um caso inédito, ilegal, que viola de forma grosseira o estatuto dos deputados nacionais e que só pode ser entendido como um ato de manifesta intromissão na política e de perseguição pessoal por parte de um titular de um órgão judiciário, o procurador-geral da República”, refere o PCD, num comunicado lido hoje na sede do partido, pelo porta-voz Olegário Tiny.

Notícias -
Olegário Tiny

O Partido de Convergência Democrática (PCD, sem representação parlamentar) acusou hoje o procurador-geral da República são-tomense de “perseguição pessoal”, após este requerer o levantamento da imunidade parlamentar ao ex-presidente do parlamento e ex-dirigente do partido, Delfim Neves.

A comissão política do PCD, do qual Delfim Neves foi dirigente e deputado por várias décadas, incluindo na última legislatura (2018-2022), enquanto presidente da Assembleia Nacional, constatou “com veemente repúdio, o pedido de levantamento de imunidade ao deputado Delfim Neves solicitado pelo procurador-geral da República à Assembleia [Nacional], com o fundamento na necessidade de ser ouvido, como testemunha, nos processos alusivos aos trágicos acontecimento do dia 25 de novembro, no Quartel do Morro”.

“Esse ato é condenável a todos os títulos, e poderia constituir um perigoso precedente, suscetível de pôr em causa as garantias individuais dos deputados caso seja/fosse aprovado”, sublinhou o PCD.

Contactado pela RSTP, o procurador-geral da República, Kelve Nobre de Carvalho, escusou-se a comentar.

Na semana passada, fonte judicial avançou à Lusa que o MP quer ouvir Delfim Neves na qualidade de testemunha, já que o ex-presidente do parlamento (2018-2022) foi detido pelos militares na madrugada de 25 de novembro, pouco depois de o assalto ser dado como “neutralizado”, e levado para o quartel-general das Forças Armadas, onde ao longo desse dia morreram quatro pessoas, sob custódia militar.

Segundo o presidente da comissão parlamentar encarregue do assunto, Elísio Teixeira, os deputados analisaram o assunto durante três sessões de trabalho, tendo ouvido Delfim Neves (eleito nesta legislatura pelo movimento Basta) e concluído pela inviabilidade do pedido do MP.

“Neste momento não é possível a Assembleia Nacional levantar imunidade ao deputado Delfim Neves porque a lei é clara: só se levanta a imunidade quando houver fortes indícios da prática de crime, e o pedido do Ministério Público fala sobre ser ouvido como declarante”, disse Elísio Teixeira, num vídeo publicado no Facebook na Assembleia Nacional, na terça-feira.

No entanto, segundo o deputado do grupo parlamentar da Ação Democrática Independente (ADI, maioria absoluta), o parecer aprovado pela comissão aconselha o plenário composto por 55 deputados “a não levantar imunidade do deputado” Delfim Neves, mas a autorizar “que ele seja auscultado como declarante e isso é possível preservando ele a sua imunidade parlamentar”.

Na segunda-feira, os advogados do ex-presidente da Assembleia Nacional informaram o Ministério Público que “Delfim Neves, na qualidade de deputado, como exímio colaborador da justiça, entendeu pedir a suspensão do seu mandato” de deputado por “30 dias” e “colocar-se à inteira disposição da justiça”.

Um dos advogados, Pedro Sequeira de Carvalho, admitiu que é o “entendimento” e “objetivo” da defesa que com a suspensão de mandato não seja necessário a análise do pedido do Ministério Público pelo plenário da Assembleia Nacional.

O advogado de Delfim Neves considerou ainda “evidente” a questão de um jornalista, que lhe perguntou se o ex-presidente do parlamento são-tomense está a ser alvo de “um ataque direto”.

“Isto é evidente, está patente”, afirmou Sequeira de Carvalho. “E neste momento, nós cidadãos são-tomenses de bom senso e que amamos a nossa pátria devemos começar a pensar: ‘depois desse processo, o que será?’  […] neste processo está-se a beliscar, e de que maneira, as relações de todos os géneros e, para piorar, está-se a descredibilizar muito as nossas instituições”, disse Sequeira de Carvalho.

Referindo-se ao assalto ao quartel ocorrido em 25 de novembro, a comissão política do PCD considerou hoje que “o primeiro-ministro, Patrice Trovoada [ADI], deliberadamente se candidatou ao lugar de primeiro suspeito em todo esse processo, ao anunciá-lo ao país de forma atabalhoada, em clara usurpação de um direito constitucional apenas conferido, nos termos dos artigos 77.º e 80º. da Constituição, ao Presidente da República, enquanto comandante supremo das Forças Armadas”.

O PCD considera que “a situação política do país caracteriza-se por sinais de evidente preocupação e medo, motivados pelas flagrantes contradições forjadas pelas intervenções do primeiro-ministro, Patrice Trovoada, e outras autoridades que se pronunciaram desde o início a propósito do que parece ser cada vez mais uma inventona arquitetada por algumas mentes ainda camufladas e que culminaram com os bárbaros assassinatos amplamente publicitados de quatro cidadãos”.

Na noite de 24 para 25 de novembro, quatro homens atacaram o Quartel do Morro, na capital são-tomense, numa ação que a justiça disse ser a primeira etapa de um plano que visava a “subversão da ordem constitucional”. Três dos quatro atacantes detidos pelos militares morreram horas depois no quartel, após maus-tratos.

Após ter sido detido pelos militares na sua casa, na madrugada de 25 de novembro, Delfim Neves foi detido, e depois libertado, quatro dias depois, após audição em tribunal.

O MP são-tomense deduziu acusação sobre o ataque no passado dia 23 de fevereiro, acusando 10 arguidos – nove militares e um civil – pela prática, em coautoria e concurso efetivo, de um crime de alteração violenta do Estado de Direito, sete crimes de homicídio qualificado na forma tentada, um crime de ofensas corporais com dolo de perigo, um crime de sequestro agravado e um crime de detenção de arma proibida, no caso do ataque ao quartel-general.

Em relação a Delfim Neves, que teria alegadamente sido identificado como financiador do ataque, o processo foi arquivado.

Últimas

Topo