Em menos de 24 horas foram tornados público dois acórdãos produzidos pelos Juízes do TC contendo decisões contraditórias sobre a mesma matéria.
O primeiro acórdão divulgado nas redes sociais foi assinado por dois juízes. Pascoal Daio, Presidente do Tribunal Constitucional e antigo advogado do candidato Delfim Neves, e Hilário Garrido, Cunhado do candidato. Neste acórdão os dois juízes defenderam que “a necessidade de legitimação dos poderes pleiteia a favor desta possibilidade excecional de recontagem integral dos votos” face ao pedido apresentado pela candidatura de Delfim Neves, que também é Presidente da Assembleia Nacional. Os dois juízes decidiram “conceder provimento ao recurso” e ordenaram “as comissões eleitorais distritais a proceder a recontagem integral dos votos para a eleição do Presidente da República”.
O acórdão do TC, datado de 23 de julho, e divulgado este domingo nas redes sociais, foi assinado apenas por Pascoal Daio e Hilário Garrido, sem indicação do relator. Outros três juízes do TC não assinaram o acórdão e são referidos na decisão com a indicação de “voto vencido” e “incontactável” à frente dos seus nomes.
Três juízes do TC rejeitam a recontagem de votos e pedem intervenção do PR
Os três juízes dados como “vencidos” e “incontactável” pelo acórdão assinado apenas por dois dos seus pares, acusam o presidente do Tribunal Constitucional e o juiz Hilário Garrido de pretenderem “impor uma decisão tomada por minoria” e dizem que “não são vencidos e, não o podem ser” porque “exprimiram o seu voto de forma maioritária, para a não recontagem dos votos”.
Os juízes pediram ao Presidente da República, Evaristo de Carvalho, para utilizar os “poderes que a Constituição da República lhe confere, para a reposição da normalidade no processo eleitoral em curso”.
Em carta enviada ao Chefe de Estado, os juízes-conselheiros Maria Alice de Carvalho, Jesuley Lopes e Amaro Couto, que formam a maioria no TC, pediram a intervenção de Evaristo Carvalho para “a reposição da credibilidade” da instituição e “da normalidade no processo eleitoral” em curso no país.
Em causa está o facto de outros dois juízes terem assinado um acórdão à revelia da maioria do plenário, ordenando uma recontagem dos votos da primeira volta, a pedido do terceiro candidato mais votado, Delfim Neves, presidente do Parlamento.
“Está-se numa situação de funcionamento anormal de uma instituição tão importante como é o Tribunal Constitucional” lê-se na carta endereçada ao Presidente da República.
Na carta, com cópia para o primeiro-ministro, presidente da Supremo Tribunal de Justiça e Procurador-Geral da República, os juízes-conselheiros Maria Alice de Carvalho, Jesuley Lopes e Amaro Couto explicam ao Presidente da República os contornos da existência de dois acórdãos do TC sobre a mesma matéria.
“A decisão sobre o processo foi tomada no plenário do Tribunal Constitucional, de sexta-feira, 23 de julho de 2021, tendo o Juiz Hilário Seabra Garrido declarado afinidades familiares suas com o recorrente e proclamando-se impedido no processo”, explicam, referindo que a maioria do plenário decidiu “contra a recontagem dos votos por inexistência de cobertura legal”.
Após esta decisão, segundo os juízes, no sábado, “o juiz-presidente do Tribunal Constitucional convocou de novo o Plenário do Tribunal, sugerindo de novo decisão a favor da recontagem dos votos”. Mas, neste plenário, a decisão contra a recontagem manteve-se.
No domingo, 25 de julho, o juiz-presidente “enviou o oficial de diligências deste tribunal às residências dos outros juízes com um acórdão, apontando a recontagem dos votos, assinado pelo próprio presidente do Tribunal Constitucional e pelo juiz Hilário Garrido”, que se havia “declarado impedido” anteriormente.
Maria Alice de Carvalho, Jesuley Lopes e Amaro Couto recusaram assinar o referido acórdão porque “já tinham votado, recusando a contagem dos votos e dois deles já tinham assinado o acórdão neste sentido”.
Nas eleições de 18 de julho, passaram à segunda volta o candidato Carlos Vila Nova, apoiado oficialmente pela Ação Democrática Independente (ADI, oposição), com 39,47%, e Guilherme Posser da Costa, apoiado pelo Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe – Partido Social Democrata (MLSTP-PSD, no poder), que obteve 20,75%, segundo a Comissão Eleitoral Nacional.