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Coceição Lima vence concurso internacional “Poemas em tradução 2021”

Conceicao-lima

Com a situação pandémica no mundo  o terceiro concurso Poemas em tradução reuniu 606 poemas de 327 poetas de 79 países que foram traduzidos de 61 idiomas.

“O poema ”Afroinsularidade”, do meu primeiro livro, ”O Útero da Casa”, traduzido por David Shook, e o poema ”0”, da poetisa salvadorenha Lauri Garcia Duenas, traduzido por Olivia Lott, foram os vencedores ex aequo do Concurso de Tradução de Poesia 2021, organizado pela revista literária Words Without Borders, em parceria com a Academia Americana de Poetas”, confirmou a própria Conceição Lima na sua página do facebook.

Segundo Conceição Lima “a selecção foi feita pela equipa editorial da revista e pela juíza Airea D. Matthews” e “o anúncio oficial de todos os vencedores terá lugar no dia 27 do corrente, no âmbito do Brooklin Book Festival”.

A poetisa são-tomense desejou “parabéns especiais aos tradutores” dos textos premiados neste concurso.

O site da organização do concurso contém uma citação do júri do que, em tradução livre, lê-se: “esta tradução premiada assombra. Na veia de um texto paracolonial, o poema examina os espectros de uma mercadoria humana racializada e suas consequências ecológicas. Como se mágica ou conjurar, ‘Afroinsularidade’ eu aduscomindícios de fantasmas e termina em uma colônia de haints. A leitura de cada linha habilmente interpretada leva o leitor a confrontar lindamente as maneiras pelas quais a terra guarda as histórias que a história tenta colonizar, e como a terra vai divulgar a verdade até o descanso há muito enterrado. 

Poema “Afroinsularidade”

Deixaram nas ilhas um legado

de híbridas palavras e tétricas plantações

engenhos enferrujados proas sem alento

nomes sonoros aristocráticos

e a lenda de um naufrágio nas Sete Pedras

Aqui aportaram vindos do Norte

por mandato ou acaso ao serviço do seu rei:

navegadores e piratas

negreiros ladrões contrabandistas

simples homens

rebeldes proscritos também

e infantes judeus

tão tenros que feneceram

como espigas queimadas.

Nas naus trouxeram

bússolas quinquilharias sementes

plantas experimentais amarguras atrozes

um padrão de pedra pálido como o trigo

e outras cargas sem sonhos nem raízes

porque toda a ilha era um porto e uma estrada

sem regresso

todas as mãos eram negras forquilhas e enxadas

E nas roças ficaram pegadas vivas

como cicatrizes – cada cafeeiro respira agora um

escravo morto.

E nas ilhas ficaram

incisivas arrogantes estátuas nas esquinas

cento e tal igrejas e capelas

para mil quilómetros quadrados

e o insurrecto sincretismo dos paços natalícios.

E ficou a cadência palaciana da ússua

o aroma do alho e do zêtê dóchi

no témpi e na ubaga tela

e no calulú o louro misturado ao óleo de palma

e o perfume do alecrim

e do mlajincon nos quintais dos luchans.

E aos relógios insulares se fundiram

os espectros – ferramentas do império

numa estrutura de ambíguas claridades

e seculares condimentos

santos padroeiros e fortalezas derrubadas

vinhos baratos e auroras partilhadas.

Às vezes penso em suas lívidas ossadas

seus cabelos podres na orla do mar

Aqui, neste fragmento de África

onde, virado para o Sul,

um verbo amanhece alto

como uma dolorosa bandeira.

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