Analistas são-tomenses consideram que o Presidente da República controlará o “poder absoluto” do primeiro-ministro e presidente da Ação Democrática Independente (ADI), que detém o parlamento, o Governo e apoiou a eleição do próprio chefe do Estado.
“A tendência pode ser grande em aparecer uma espécie de um Governo totalitário, mas pelo menos os discursos iniciais, tanto do primeiro-ministro como do próprio Presidente da República no sentido de se criar pontes, tudo leva a crer que vai ser diferente […] se houver realmente uma forma de se aproximar as partes, não tem por que haver uma espécie de Governo de força, musculado porque tem todos os tentáculos do poder”, disse o ex-presidente da Assembleia Nacional Arzemiro dos Prazeres.
A ADI, do primeiro-ministro Patrice Trovoada, detém maioria absoluta de 30 dos 55 deputados do parlamento são-tomense, e apoiou a eleição do Presidente da República nas presidenciais do ano passado, além do procurador-geral da República, indicado pelo atual primeiro-ministro.
O Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social Demorcra (MLSTP/PSD), que esteve na governação nos últimos quatro anos, acusou várias vezes a o procurador-geral da República e o Ministério Público de parcialidade, sublinhando que durante este período não foram investigados os grande casos apresentados a esta instituição, sobretudo os que envolviam elementos da ADI.
“O Presidente da República terá um papel muito importante para trabalhar com o primeiro-ministro neste sentido, sobretudo para que o revanchismo não venha ao de cima, porque normalmente há sempre aquele apetite de quem ganha as eleições de vir cobrar vinganças sobre aqueles que perderam”, comentou Arzemiro dos Prazeres.
Patrice Trovoada tomou posse na sexta-feira como primeiro-ministro e pediu “concentração máxima” ao seu Governo, que será empossado na segunda-feira, e aos agentes públicos para resolver vários problemas, da economia à saúde, depois de denunciar a “decadência” do país.
O novo chefe do executivo são-tomense disse que tem “fé e esperança no futuro” do país e reafirmou-se “pronto, disponível para uma entrega total” ao serviço da Nação.
“Sou o primeiro-ministro e chefe do Governo para servir todos os são-tomenses de dentro como de fora, bem como todos os que escolheram as nossas ilhas para viverem. Por conseguinte, investido do mandato que me foi conferido, não dispensarei nenhum só minuto se não for para agir, reformar, ouvir, construir e corrigir”, afirmou Patrice Trovoada.
“A primeira impressão com que eu fico é que é um Patrice Trovoada de hoje, diferente, mais inclusivo que parece ter ganhado a consciência de que o país não precisa mais de tanta divisão, e parece querer prometer às pessoas de que muitas coisas que ele fez no passado ele já não voltará a fazer”, considerou, por seu lado, o presidente da Universidade Lusíada de São Tomé e Príncipe.
Liberato Moniz espera que a coabitação entre Patrice Trovoada e Carlos Vila Nova “seja possível e que traga benefícios muito bons para São Tomé e Príncipe”, realçando que o Presidente são-tomense “é uma pessoa pacífica que procura consenso e que desde a primeira hora tem dito que é preciso quebrar essa muralha que existe entre os são-tomenses”.
“Se esse Presidente falhar, se esse primeiro-ministro falhar, eu acho que será a desesperança final de todos os são-tomenses e eles têm de ter a consciência de que é uma alta responsabilidade […] é preciso muita competência, muita ponderação, muita seriedade, muita humildade”, disse Liberato Moniz.
“Nenhum deles está autorizado neste momento a tentar denegrir a imagem do outro […] eles têm de ser os primeiros a dar exemplo” acrescentou.
O analista político Óscar Baía admitiu que “há risco” de haver “algum atrito” entre Vila Nova e Patrice Trovoada, mas disse acreditar que o chefe de Estado saberá ultrapassar a situação.
“Patrice Trovoada, como todos nós conhecemos, é uma pessoa de determinação, de poder totalitário, daí que é preciso haver por parte do próprio Presidente da República alguma contenção no tratamento de assuntos que possam roçar o pelouro das duas pessoas”, disse Órcar Baía.
O analista alertou que “qualquer tipo de desaire em termos de coabitação vai afetar um país todo e São Tomé e Príncipe só ficará a perder”.
“Eu espero que eles saibam pelo menos fazer a gestão em privado de algumas discordâncias, consigam o entendimento “em off” sem que realmente possa sair para o exterior e criar problemas durante toda a governação”, apelou Óscar Baía.
O Presidente são-tomense nomeou no sábado o XVIII Governo do arquipélago que será composto por 11 ministros, quatro mulheres e sete homens, liderado por Patrice Trovoada, que assumiu o cargo pela quarta vez, depois de 2008, 2010-2012 e 2024-2018.
“Temos de trabalhar muito para quebrar este ciclo em que a ganância de uns e o amadorismo de outros colocaram o país”, referiu o líder da ADI, que venceu as legislativas de 25 de setembro com maioria absoluta (30 deputados de um total de 55 na Assembleia Nacional).