A ex-primeira-ministra são-tomense, Maria das Neves e demais técnicos e ex-dirigentes do país, consideram que os indicadores macroeconómicos de São Tomé e Príncipe não permitem a transição para país de rendimento médio em 2024, por isso defendem o adiamento do processo para permitir uma “graduação suave”, sem choques abruptos.
“A ideia não é não querer graduar-se. A ideia é graduar, mas quando o país tiver condições para graduar-se, porque graduar-se agora com essas condições é dar um tiro nos pés. Como é que vamos sobreviver?” – questionou Maria da Neves.
A economista e professora universitária desenvolveu um estudo entregue ao Banco Central de São Tomé e Príncipe e Príncipe (BCSTP) e à Universidade Lusíada do arquipélago no qual fez análise comparativa do processo de transição de vários países nos últimos anos e os indicadores macroeconómicos do arquipélago em 2015, quando se decidiu pela graduação, e os dados mais recentes de 2022.
O estudo foi apresentado publicamente na semana passada durante uma conferência, denominada ‘Conversas de Gravana’ organizada pela Universidade Lusíada em parceria com o Banco Central.
Segundo a economista em 2015 “os indicadores macroeconómicos até tinham boa performance”, sendo a inflação ao nível de 4%, Produto Interno Bruto (PIB) com taxa de crescimento de 3,9%, reservas internacionais que asseguravam três meses e meio de importações.
Recorda no entanto, que em 2018, quando o país deveria ter sido graduado, o Governo de então, do ex-primeiro-ministro Jorge Bom Jesus (2014-2018) “consideram que o país não tinha condições para o efeito” e solicitaram a prorrogação, que foi concedida, num período de mais seis anos “para que se pudesse preparar para a transição suave” em 2024.
“O que acontece é que nesse período pouco ou nada foi feito e hoje quando nós analisamos os indicadores, se a taxa de inflação em 2015 eram 4%, em 2022 foi de 25,2%, o [crescimento do] PIB que na altura era de 3,9% baixou para 1,5%, aliás a taxa de crescimento do nosso Produto Interno Bruto até é inferior à taxa de crescimento da população”, sublinha a ex-primeira-ministra.
Maria das Neves explicou que, no processo de alteração de patamar, as instituições internacionais tomam em consideração a evolução de três indicadores dos países, nomeadamente o PIB ‘per capita’, índice de desenvolvimento humano, e indicie de vulnerabilidade económica, sendo necessário o cumprimento de dois dos três para avançar com o processo de graduação.
“Não se tem dado a melhor atenção ao índice de vulnerabilidade económica que nós pensamos que seria o melhor indicador para ajudar na tomada de decisão”, defendeu Maria das Neves.
Neste sentido, a ex-primeira-ministra são-tomense, defende que “o país precisa de algum tempo para melhorar a sua performance macroeconómica e depois assumir a graduação porque a graduação não é sinónimo de desenvolvimento”.
Maria das Neves alertou que “um país pode graduar-se e os desafios continuarem ou as vezes aumentarem tendo em conta que a graduação implica também alguns custos”, nomeadamente a redução da ajuda pública ao desenvolvimento que afeta muito países como São Tomé e Príncipe no qual cerca de 97% das despesas de capital do Orçamento Geral do Estado dependem da ajuda externa.
“O que é necessário se fazer, mesmo admitindo que se tenha que ser graduado em 2024, é criar uma comissão, se é que ela ainda não foi criada, incentivar a comissão, intensificar os trabalhos juntamente com os parceiros, sobretudo com o PNUD para se desenhar esta estratégia de transição suave de modo a permitir que os choques não sejam abrupto”, defendeu Maria das Neves.
Em agosto do ano passado, o presidente da Assembleia Geral da ONU também defendeu a extensão do prazo para a graduação de São Tomé e Príncipe à categoria de País de Rendimento Médio, alertando que o processo “será difícil”.
“Vindo eu de um pequeno país insular, posso partilhar convosco que será difícil, desafiante, porque o processo de graduação não tem em conta as vulnerabilidades dos pequenos Estados”, disse Abdulla Shahid, natural das Maldivas, durante uma visita a São Tomé e Príncipe.
Em finais de maio passado, o governador do Banco Central de São Tomé e Príncipe admitiu que o ambiente internacional é um desafio para o país conseguir fazer a transição para o grupo de países de rendimento médio no final de 2024.
“Do meu ponto de vista, há muita coisa que tem que se negociar. Mas nós, de acordo com os nossos indicadores atuais, o esforço e de acordo com o programa, mantemos a intenção de conseguir fazer ‘upgrade’ em finais de 2024”, disse Américo Ramos em declarações à agência Lusa, à margem das reuniões anuais do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), que decorreu no Egito.
“O Governo assim decidiu e tudo se vai fazer para que consigamos passar dessa fase transitória. Mas temos que ter a plena consciência que as condições, o ambiente internacional não é muito favorável às grandes reformas que é necessário serem feitas até nós atingirmos este ‘upgrade’”, advertiu.