O sindicato dos trabalhadores da Enaport contestou hoje um acordo alegadamente assinado pelo Governo que atribui “direito exclusivo” a uma empresa francesa para a exploração dos serviços no Porto de São Tomé durante cinco anos por uma contrapartida financeira de 50% do volume de negócio.
“Nós os trabalhadores da Enaport, mais uma vez fomos confrontados com o problema da concessão da empresa e sem sermos tidos nem achados […] mais uma vez os trabalhadores da Enaport sentem-se lesados, já é a segunda vez que o Governo faz isso sem comunicar ao sindicato”, disse à RSTP o presidente do sindicato, Hermes Carvalho.
O aludido “acordo de parceria público-privada”, a que a RSTP teve acesso, terá sido assinado em 20 de dezembro, entre o Governo representado pelo ministro das Infraestruturas, Recursos Naturais e Ambiente, Adelino Cardoso, o diretor da Empresa Nacional de Administração de Portos (Enaport), Hamilton de Sousa, e o representante da empresa África Global Logistics (AGL) Pierre-François Pioriou.
Segundo o documento, a AGL, uma sociedade anónima simplificada registada em França, “entra neste acordo apenas como acionista da empresa operadora”, que será “incorporada sob as leis de São Tomé e Príncipe, cuja sede social será em São Tomé”.
A parceria prevê que durante a vigência do acordo “o operador terá o direito exclusivo de prestar os serviços no terminal”, que inclui “o cais, o terreiro e o equipamento para efeito de prestação de serviço no porto”.
O acordo é assinado “por um período de cinco anos”, podendo ser renovado por igual período ou outro, segundo a vontade das partes.
“A autoridade [Enaport] concede ao operador, a partir da data em que todas as condições precedentes foram satisfeitas e para o termo, o direito exclusivo de uso nos ativos da autoridade […] juntamente com todos os direitos e servidões que lhe pertençam com a finalidade de implementar e executar o projeto”, lê-se no documento.
Com o acordo, a Enaport atribui à empresa a execução de vários serviços, nomeadamente os “relacionados com o manuseamento de carga no terminal”, que inclui a “estiva, expedição, armazenamento e entrega”, manutenção e reparação adequadas de equipamentos, fornecimento de sistema de faturação, fornecimento de um rebocador que a Enaport pagará mensalmente.
A empresa terá ainda o direito de fazer o “destacamento de uma equipa de gestão de peritos portuários com um diretor executivo, um diretor de operações, um diretor financeiro e dois gestores administrativos e ou técnicos para gerir eficazmente o terminal”.
No entanto, “para a execução dos serviços, o operador beneficiará da mão-de-obra existente no Porto”, mas “este pessoal permanecerá diretamente empregado pela autoridade [Enaport] e apenas a equipa de gestão de peritos fornecida pelo operador será empregada ou contratada pelo operador”.
Pelo “direito de gerir e operar o terminal” a empresa pagará à Enaport “‘royalties’ mensais de 50% do volume de negócios gerado pelo operador”, sendo que “todos os pagamentos serão feitos em moeda nacional” são-tomense, a dobra.
O presidente do Sindicato dos trabalhadores da Enaport disse que a empresa paga 70 mil dólares (63,5 mil euros) mensais pelo aluguer de um rebocador, mas a empresa pediu “uma carta conforto” recentemente ao Governo para a aquisição do seu próprio equipamento, mas o ministro das infraestruturas recusou.
Hermes Carvalho considerou que com um rebocador, uma grua nova e mais uma máquina a Enaport seria uma empresa que “anda com os próprios pés e ainda pode ajudar o Governo no Orçamento Geral do Estado”.
O acordo é assinado após menos de um mês de o Governo ter contratado através de um concurso público um novo diretor geral para a Enaport.
Os trabalhadores exigiram a presença do ministro das Infraestrutura na sede da Enaport para prestar esclarecimento sobre o novo acordo, sob pena de adotarem outras medidas de reivindicação.
A RSTP contactou o Ministério das Infraestruturas, Recursos Naturais e Ambiente para pedir esclarecimentos sobre a alegada concessão, mas este organismo escusou-se a responder.
Em outubro, o Governo são-tomense anunciou a rescisão definitiva de um contrato de concessão do porto ao consórcio ganês Safebond assinado pelo anterior Governo, liderado pelo ex-primeiro-ministro Jorge Bom Jesus (Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social Democrata – MLSTP/PSD), que incluía a gestão por 30 anos dos portos de Ana Chaves e Fernão Dias (por construir), na ilha de São Tomé, e o porto de Santo António, na ilha do Príncipe.
“Este Governo até agora tem manifestado preocupação para defender a Enaport, incluindo os trabalhadores da Enaport, para defender os bens” da empresa, disse o primeiro-ministro, Patrice Trovoada, após uma visita ao Porto, em outubro.