A empresa são-tomense San Ubá Budú quer reaver a posse de cerca de 156 hectares de terras que lhe foram retirados pelo anterior Governo e entregues a investidores russos, num processo que diz ter sido uma “montagem mafiosa” liderada pelo ex-primeiro-ministro Patrice Trovoada e o ex-ministro da agricultura Abel Bom Jesus, mas o ex-ministro rejeitou a acusação e defendeu a legalidade do ato.
“O que aconteceu foi uma montagem mafiosa, ardilosamente arquitetada por um conjunto de pessoas. Estou a falar do ex-primeiro-ministro Patrice Trovoada, estou a falar do ex-ministro da agricultura Abel Bom Jesus […]. Fizeram toda uma montagem no sentido de me roubar a posse que eu tinha desse empreendimento”, denunciou Deodado Tiny, sócio-gerente da empresa San Ubá Budú.
O engenheiro agrónomo são-tomense é sócio-gerente da sociedade criada no ano 2000 para a produção e exportação de cacau numa área de mais de 156 hectares que chegou a empregar cerca de 70 trabalhadores e garantiu a exportação de centenas de toneladas de cacau.
O empresário disse que, em meados de 2024, foi surpreendido com uma carta do anterior Governo liderado pelo ex-primeiro-ministro Patrice Trovoada sobre a decisão de retirar a posse das terras à San Ubá Budú e, apesar da contestação, a decisão não foi anulada pelo Governo.
“Vieram já com uma equipa de segurança […] que eles contrataram aqui, escorraçaram as pessoas que estavam aqui a trabalhar […] nem sequer permitiram que nós puséssemos o cacau que estava sendo quebrado nas caixas de fermentação”, contou.
Deodato Tiny acusou os ex-governantes são-tomenses de negócios obscuros com os empresários russos.
“Porque isso é escandaloso […] nunca vi acontecer uma coisa semelhante”, lamentou.
Ouvido pela RSTP, o ex-ministro da Agricultura de São Tomé e Príncipe Abel Bom Jesus afirmou que o processo de retirada das terras fazia parte da estratégia do anterior Governo para estimular a produção agrícola, e também visou outras pessoas, incluindo dois ex-primeiro-ministros, nomeadamente Guilherme Posser da Costa e Maria das Neves.
“A doutora Maria das Neves também é uma das visadas, que, se eu não saísse do Governo, a essa altura eu já teria uma resposta ou já poderia ter posicionado […]. Guilherme Posser da Costa, eu visitei também a propriedade dele, também recebeu notificação e começou a agir”, relatou.
Abel Bom Jesus assegurou que a decisão de retirar as terras à empresa San Ubá Budú foi tomada após as constatações que fez numa visita ao local.
“Eu visitei aquela média empresa, o que eu vi é uma empresa em falência, a degradar-se a cada dia a mais”, disse Abel Bom Jesus.
“E também é do meu conhecimento que o senhor […] estava a trabalhar no sentido de vender aquela empresa para um grupo português que queria investir (…). Como é que uma coisa que não é tua, você vende e ganha centenas de milhões de euros. O próprio Estado anda aqui na falência?”, questionou.
O empresário admitiu que a empresa estava “numa situação financeira relativamente difícil”, e que estava em contacto “com parceiros internacionais”, nomeadamente de Portugal, da Arábia Saudita e russos, “que manifestaram interesses” em “fazer parceria”.
Quanto ao grupo russo, esclareceu que não se tratava do mesmo ao qual o anterior Governo atribuiu as terras.
Os empresários são-tomenses afirmaram que recorreram à Justiça em 2024 para reverter a decisão do ex-ministro da Agricultura, mas até ao momento não tiveram respostas. Perante a morosidade da Justiça, Deodado Tiny apelou ao novo Governo, liderado por Américo Ramos, para anular a decisão.
“Da mesma forma que o Abel Bom Jesus deu as terras como ministro da Agricultura aos russos, se os russos não estiverem a usá-la, o atual ministro da Agricultura tem o poder de retirar. Mas se os russos estão a fazer o bom uso de terra, estão a investir, estão a ajudar na economia do país, eles não têm como retirar a não ser que eles façam aquilo que nós temos estado a fazer em São Tomé e Príncipe, que é agir pela ilegalidade”, reagiu Abel Bom Jesus.
