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O Príncipe à Deriva: Entre a Hegemonia da UMPP e o Vazio de Alternativas

São Tomé e Príncipe deve ser um dos países com mais partidos por metro quadrado e per capita. Isso apenas demonstra a fragilidade da nossa democracia. Pior ainda: evidencia a ausência de valores.

Faltando pouco mais de dois anos para as próximas eleições, começam já a notar-se as primeiras movimentações no xadrez político regional. A UMPP, uma espécie de partido-Estado, comanda os destinos da Região Autónoma do Príncipe há quase 20 anos. Verdade seja dita, muitas coisas foram feitas, mas posso afirmar que as principais ficaram por fazer. E tudo por culpa da dupla insularidade, dizem eles. O movimento vive em campanha permanente.

A hegemonia da UMPP

Desde o seu surgimento, já ocorreram divisões internas que culminaram com o aparecimento de outros movimentos, liderados por Nestor Umbelina, mas que não têm sido suficientes para desbancar a hegemonia da UMPP.

Nestor é uma espécie de acompanhante de luxo na política — só aparece em grandes eventos e vive uma espécie de intermitência política.

O cenário político na Região Autónoma do Príncipe é tão entusiasmante quanto confuso. Com o surgimento da UMPP, o movimento congregou todas as forças políticas existentes na ilha na altura. Estratégica e politicamente, foi um erro por parte dos partidos aderentes, mas uma jogada de génio do seu fundador, José Cardoso, que viria a liderar a ilha durante década e meia, com excelentes resultados numa primeira fase.

A transição e a estagnação

Por desgaste pessoal e político, José Cardoso abandonou o poder e nomeou Filipe Nascimento como seu sucessor, o que criou crispações dentro do movimento. Muitos dos seus companheiros consideraram essa atitude algo traiçoeira. No entanto, passados cinco anos, é Filipe quem lidera os destinos da ilha.

Mas estará a ilha do Príncipe melhor?

Nem melhor, nem pior. Pior do que estar melhor ou pior é a estagnação. A ideia é simples: se estamos melhores, preocupamo-nos com outras coisas, como o prazer; se estamos piores, o nosso foco é melhorar. Já a estagnação é confusa — não sabemos a nossa real condição. A única forma de sair deste estado é assumir uma posição clara. Caso contrário, a conformação será o caminho. E é um pouco disso que se tem vivido na ilha do Príncipe.

A autonomia como conceito incompreendido

Antes da UMPP, as eleições regionais eram uma miragem. O poder era repartido entre os mesmos de sempre e a culpa era atribuída à insularidade e aos ‘camaradas do outro lado do oceano’.

A autonomia tem sido, acima de tudo, marcada pela incompreensão do que ela realmente significa. Não se trata apenas de descentralização do poder político, mas também da capacidade de gerar vantagens concretas para a população. Essa falta de compreensão é visível em ambas as ilhas. Não podemos justificar a ausência de investimentos com a dupla insularidade — isso deve-se, no mínimo, à nossa incapacidade de atrair investidores. E pior ainda: persiste uma confusão grave entre o papel do Estado e do sector privado. Falta aos sucessivos governos a coragem de assumir claramente as suas posições.

Alternativas ou oportunidades perdidas?

Nestor assumiu publicamente o seu desgaste e parece não ter intenção de se candidatar nas próximas eleições. Até lá, resta esperar.

Por outro lado, o que me deixa satisfeito é o surgimento de várias alternativas. Apesar de não ser defensor da criação constante de novos partidos como resposta à falta de alternativas, vejo com bons olhos o posicionamento dessas novas forças — muitas delas com origem na diáspora, da qual terei todo o gosto em fazer parte.

São Tomé e Príncipe deve ser um dos países com mais partidos por metro quadrado e per capita. Isso apenas demonstra a fragilidade da nossa democracia. Pior ainda: evidencia a ausência de valores. Para alguns, criar partidos é apenas uma forma fácil de alcançar o poder, mesmo que seja apenas para se protegerem sob o guarda-chuva da Assembleia Nacional ou Regional.

Pessoa certa, momento errado?

Filipe Nascimento, apesar de jovem na política, já demonstra hábitos antigos: ‘quem não está comigo, está contra mim’. Os seus mandatos têm sido manchados por escândalos e acusações de desvios de fundos, nomeadamente dos impostos pagos por investidores na ilha.

Apesar disso, continuo a acreditar que Filipe tem a competência necessária para liderar a ilha. Contudo, parece estar ‘contaminado’ pelo núcleo duro da UMPP — um vício político. Noutras condições, não haveria sequer necessidade de buscar uma alternativa. Mas é importante distinguir entre alternativa e solução: Filipe continua a ser uma alternativa, mas já não é a solução que a ilha necessita.

A solução requer decisores preparados, conscientes, e sobretudo, desprovidos de egoísmo.

O caminho para uma nova política

Quanto ao surgimento de novas alternativas — algumas com passado político — o sucesso dependerá de diversos factores específicos da ilha. É essencial que todos estejam conscientes de que não é tarefa fácil combater a UMPP e o seu sistema de perseguição contínua.

Numa ilha onde a falta de informação é alarmante, o meu conselho é que se procure, tanto quanto possível, conquistar aquela faixa da população que permanece silenciosa e desinformada. Aí reside o verdadeiro potencial de mudança.

*O autor é observador atento da política regional e escreve a título pessoal.*

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