Uma opinião: PEC à luz da teoria da dependência
Aquando do depósito de instrumento de ratificação do acordo de mobilidade no espaço da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa por parte de Portugal, cidadãos do PALOP, com particular destaque para os são-tomenses que pugnam por um amanhã melhor manifestaram nas redes sociais, de maneira efusiva, a vontade de deixar sua pátria natal a qualquer preço!
Poder-se-ia, no nosso entender, levantar um conjunto de hipóteses políticas, económicas e sociais, que legitimam essa pretensão sem nunca pôr em causa o nacionalismo, o amor à terra. Preferimos, no entanto, deixar no ar a seguinte questão: o que São Tomé e Príncipe pode oferecer a Portugal, e vice-versa, para que um dia se consiga esbarrar, na prática, a execução da teoria da dependência?
Em traços gerais, a teoria dependencista advoga que a riqueza dos países desenvolvidos, capitalistas (centro) nada mais são senão a desapropriação da riqueza dos países em vias de desenvolvimento, subdesenvolvido ou pobre (periferia); que o modo de produção capitalista expande-se para os países desenvolvidos e que as mais-valias criadas são novamente retiradas da periferia para o centro.
Dependência rima com subdesenvolvimento, em certos casos com a miséria, uma condição que o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, nos seus índices, certifica a São Tomé e Príncipe volvidos 46 anos de independência.
Os teóricos dependencistas argumentam que as origens do subdesenvolvimento remontam aos séculos XV e XVI, momento em que, segundo a historiografia portuguesa, seus antepassados teriam descoberto São Tomé e Príncipe. Durante todo o processo de colonização, que se lhe seguiram, 1470-1975 -, a produção do cacau e do café fez com que os colonos europeus desenhassem e implementassem o estruturalismo enquanto corrente de pensamento que depreende a realidade social a partir de um conjunto considerado elementar de relações, numa ínfima porção do seu território de 1001 km2, então colónias de S. Tomé e Príncipe, o suficiente para atingir a liderança do comércio internacional, no que produção de cacau diz respeito.
Em 1950, isto é, uma década e meia aproximadamente da independência política das Ilhas, como reação à escola liberal, a teoria da dependência emerge configurando uma revisão da abordagem marxista à economia internacional. Ou seja, uma análise social e económica alicerçada nas relações de classe e conflito social, que utiliza uma interpretação materialista do desenvolvimento histórico e uma visão dialética de transformação social.
Questiona-se, por isso: a respeito de Programas Estratégicos de Cooperação, para quando uma reação são-tomense que se coaduna com as aspirações de 1975 ou dos ideais de refundação de 1990?
Pensamos que, hoje, nenhum cidadão são-tomense duvida que para ultrapassar o subdesenvolvimento é necessária uma reorganização interna, isto é, resgatar o escudo da unidade, da disciplina e do trabalho, mas implica, também, necessariamente, alterações nas relações comerciais externas…
Daí que, o PEC – Programa Estratégico de Cooperação – um plano de cooperação que Portugal alinha às ditas prioridades dos seus parceiros de desenvolvimento das suas ex-colónias, num determinado período de tempo, era um documento há muito esperado por setores devidamente identificados tanto no centro como na periferia. Diz-se, por exemplo, que, o novo PEC para São Tomé e Príncipe, assinado a 3 de dezembro, em Lisboa, está avaliado em 60 milhões de Euros para os próximos 5 anos…
Feito o exercício de análise à luz da teoria da dependência, sem dogmatismos e exageros, excluído o sentimento de “pobre e mal-agradecido”, ficou evidente que o seu aparecimento está desprovido de “novidades”. Por outras palavras, as “riquezas voltam a vazar para o centro”…
Sublinha-se, no entanto, a boa vontade de Portugal e dos seus contribuintes em cooperar com São Tomé e Príncipe; e dos são-tomenses ávidos em receber “ajuda”, conjugando a dependência. Vinca, por conseguinte, uma vez mais, a cooperação desigual. Um sentimento de frustração que apenas entende àqueles que estão desprovidos de recalcamentos políticos, à são-tomense ou de paternalismo-colonial, à portuguesa.
É chegado o momento para que, avizinhando-se ou não períodos eleitorais, tanto lá como cá, com ou sem pressão do parceiro (?), a verdadeira sociedade civil, académicos e outros, debatam e escrutinem tais documentos na sua fase embrionária, oferecendo linhas de interação política, económica e social, suscetível de, como fizera Prebisch, evidenciar a deterioração dos termos de troca, para que os PEC’s com qualquer parceiro de desenvolvimento seja, no mínimo, uma “solução” dependencista para ultrapassar o subdesenvolvimento.
É tão-somente uma opinião.
*É professor de Negócios Internacionais na Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade de São Tomé e Príncipe.
Por Esterline Gonçalves Género*