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Um mês depois do assassinato de Maria Filomena, familiares pedem celeridade na justiça

Maria Filomena

Os familiares de Maria Filomena, assassinada há um mês em São Tomé sob a acusação de prática de feitiçaria, pedem celeridade na justiça para que o caso “não caia no esquecimento”, lamentando o alegado envolvimento de bombeiros no crime.

Maria Filomena Matos tinha 57 anos e um “diagnóstico de epilepsia, que era tratada em Portugal”.

Mesmo em São Tomé era acompanhada à distância, mas, por não haver neurologistas no arquipélago, começou a ter crises epiléticas que desencadearam em doença mental por não ter acompanhamento e medicação adequada.

“Ela era uma pessoa muito calma, dócil, nunca foi violenta e eu não percebo como é que, alegadamente, os bombeiros, ao invés de salvarem, ajudaram a tirar-lhe a vida”, disse à RSTP a sua única filha, Eliana Matos.

Eliana Matos, que reside em Portugal e se deslocou a São Tomé após a morte da mãe, disse ter sido informada que Maria Filomena “foi presa num poste em frente à sede dos bombeiros” e as testemunhas “disseram que [foram] os bombeiros que começaram o ato”, enquanto outros cidadãos estavam a filmar, “a zombarem e ninguém para ajudar”.

A filha da vítima, sublinha que, no local do crime, havia seguranças de uma farmácia e da escola e era perto da residência do ministro da Defesa e Administração, Jorge Amado, que também tinha seguranças, mas “ninguém prestou auxílio”, pelo que considera que “estas pessoas todas devem ser ouvidas”.

“Nós demos nomes de testemunhas que não foram ouvidas ainda e o nosso receio é que essas testemunhas possam sair do país e são testemunhas que participaram direta ou indiretamente no caso”, alertou.

“A justiça diz que o trabalho está a ser feito. Nós sabemos que sim, mas nós queremos mais, nós sabemos que São Tomé é um país tão pequeno que faz um mês e nós não temos o caso concluído. Essa é a nossa dor, essa é a nossa angústia, nós queremos que o caso seja concluído e que não caia no esquecimento”, acrescentou Eliana Matos.

A filha de Maria Filomena disse acreditar nos órgãos da Justiça que são a “única esperança”, mas querem “sempre mais” para a responsabilização dos envolvidos.

“A minha mãe morreu em sofrimento e sem dignidade”, lamentou.

Quanto à reação da sociedade, Eliana Matos considera que “uma parte da população mostrou-se empática”, mas outra não, “porque não lhes tocou a eles”, vaticinando que, “se isso não for resolvido, vai acontecer com outra pessoa, porque está a ser um crime rotineiro” em São Tomé e Príncipe, principalmente com idosos e pessoas vulneráveis.

Segundo Eliana Matos, o relatório médico confirma que “o corpo chegou sem vida” ao hospital, mas os polícias “dizem que não”.

“Eu recorri à organização Mundial de Saúde e fiz o relatório que diz que houve violação dos Direitos Humanos, a partir do momento em que a minha mãe morre em sofrimento, sem dignidade, com participação ativa e passiva dos bombeiros e alguns seguranças arredores”, adiantou Eliana Matos, assegurando que vai “recorrer a todas as instâncias possíveis e impossíveis” para conseguir justiça.

O assassinato de Maria Filomena foi analisado pelo Conselho de Ministros, tendo sido considerado de “homicídio bárbaro de uma cidadã apelidada de feiticeira”, pelo que o executivo expressou “o seu mais veemente repúdio contra este ato de selvajaria, que atenta contra os direitos humanos mais elementares e a dignidade da pessoa humana”.

“Não podemos tolerar que, em pleno século XXI, ainda existam no nosso país casos de discriminação, perseguição, violência e assassinatos por motivos de crença, estigma social ou superstição, o que contradiz os princípios fundamentais de igualdade e respeito aos direitos humanos”, lê-se no comunicado do Conselho de Ministros.

O Conselho de Ministros “determinou a célere investigação e rigorosa atuação judiciária para apurar os factos e implementar todas as medidas necessárias para garantir que os responsáveis por esse ato hediondo sejam levados à justiça e responsabilizados por estes crimes, e encoraja a população a denunciar os mesmos”.

Na sequência das investigações, o Ministério Público deteve dois bombeiros sob suspeita de participação no homicídio de Maria Filomena Matos e, presentes ao juiz de instrução criminal, foi decretada prisão preventiva a um e proibição de se ausentar do país a outro.

Antes, os dois bombeiros haviam sido libertados à força pela corporação que invadiu as instalações da Procuradoria-Geral da República, num cenário com dezenas de homens que parquearam viaturas de combate a incêndio e ambulâncias com sirenes ativadas.

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