Começou hoje o julgamento de sete pessoas, incluindo três bombeiros, acusados pelo sequestro, ofensas corporais, coação grave, tortura e outros tratamentos cruéis que causaram a morte de Filomena Matos, mulher que acusaram de feiticeira, em Dezembro do ano passado.
Segundo a acusação do Ministério Público, datada de março, os três agentes da Proteção Civil e Bombeiros foram acusados pela prática “em autoria material, na forma consumada e em concurso real, [de] um crime de ofensas corporais […] e um crime de coação grave”.
Os quatro civis, três dos quais atualmente em prisão preventiva, foram acusados como coautores de “um crime de tortura e outros tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos graves” e, “em concurso aparente, com um crime de ofensas corporais graves” e ainda por “um crime de sequestro”.
Segundo a acusação do MP, a que a RSTP teve acesso, em consequência direta das condutas dos arguidos civis, a mulher “sofreu várias lesões no seu corpo”, que provocaram poli-traumatismo grave e que “resultaram como causa direta do choque hemorrágico e consequente morte da mesma”.
Segundo a acusação, na madrugada do dia 20 de dezembro do ano passado, a mulher vagueava à frente do comando dos Bombeiros de Água Grande quando foi interpelada por elementos da corporação que lhe desferiram “golpes de pontapés na coxa e perna” e “várias palmadas em lugares indistintos do corpo”, atos que apenas culminaram com a ordem do oficial de dia “para que todos se recolhessem ao comando”.
O MP refere que, após isso, os arguidos civis e outros suspeitos não identificados conduziram a mulher até ao quintal de uma das arguidas, que a acusava de a estar a “matar com feitiçaria”, pressionando-a a que a curasse, tendo, em seguida, sido brutalmente agredida.
“A senhora foi submetida a uma tortura brutal durante várias horas, amarrada num poste de eletricidade de alta tensão até a morte”, sublinha a advogada Celiza de Deus Lima, que é assistente nos autos em representação da família da vítima.
Em declarações à RSTP, a advogada destacou o papel do Ministério Público e dos familiares de Maria Filomena Matos que permitiram identificar de “forma célere” os envolvidos no processo, embora tenha lamentado que muitos não sido constituídos arguidos por não ter sido possível recolher elementos de prova suficientes.
“Esperamos e temos a convicção de que se há de fazer justiça neste processo. Precisamos de pacificar a sociedade e passar um sinal claro que os nossos idosos não podem ser vistos como feiticeiros”, defendeu a advogada.
Celiza Deus Lima adiantou que será exigida a corresponsabilização do Estado, uma vez que estão envolvidos agentes dos bombeiros que agiram fardados e “que tinham a obrigação, em razão das funções que exercem, de proteger a vítima e não de participar desse ato bárbaro”.
Em janeiro, dezenas de bombeiros protagonizaram um cerco às instalações do Ministério Público (MP) e libertaram à força dois colegas que estavam detidos sob indícios de participação na morte de Filomena Matos.
Quatro bombeiros são-tomenses, incluindo o ex-comandante da corporação Felisberto Bragança, foram depois do cerco constituídos arguidos e ficaram em prisão preventiva.