Violência Doméstica: ‘Ele bate-me, e eu grito pedindo socorro e ele bate ainda mais forte’
As mulheres podem ser/são tão violentas em casa como os homens, por isso para a resolução desses conflitos, tanto homem como a mulher devem ser tratados da mesma forma.
Depoimentos
“Um dia saí para ir à cidade e ele pediu-me para comparar banana para seu amigo e eu disse que não, porque eu estava bem vestida e não iria entrar no mercado. Isto levou-o a dar-me um soco na cara e fiquei irreconhecível.”
“No outro dia, ele pegou machim para matar-me, e eu estava grávida de 9 meses e ainda assim, saltei a janela e refugiei-me na casa dos vizinhos e um dia saí e nunca mais voltei.”
Violência Doméstica
A violência doméstica é um crime que ocorre entre indivíduos que estabelecem relações familiares e/ou de convivialidade no espaço doméstico, ou por causa dele, e inclui a violência física, psicológica e sexual. Na perspectiva do sociólogo Anthony Giddens, a violência doméstica é definida como o abuso de um membro da família em relação a outro ou outros membros.
A violência doméstica é um problema tão antigo quanto a humanidade e constitui um problema universal, na medida em que viola os direitos fundamentais do homem e é visível em qualquer cultura, religião, etnia e sociedade. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), “a violência doméstica é hoje amplamente reconhecida como um grave problema em matérias de direitos humanos e de saúde pública.”
Em São Tomé e Príncipe (STP), o crime da violência doméstica encontra-se estatuído no Código Penal aprovado pela Lei nº.6/2012 de 6 de Agosto e na Lei nº.11/2008 de 29 de Outubro, que aprova o regime de violência familiar. Estas leis visam prevenir e punir os crimes de violência doméstica e garantir o apoio às possíveis vítimas deste mesmo ato ilícito no país. De acordo com o artigo 7º da Lei acima citada atribui a violência doméstica as seguintes formas: violência física, violência psicológica, sexual, patrimonial e moral.
Segundo os dados da Polícia Nacional, até Maio de 2019, houve 365 casos registados de violência doméstica, pelos seus serviços, e na sua maioria contra as mulheres, totalizando em média 73 casos por mês. Segundo a doutora Vera Cravid, magistrada do Ministério Público, de Janeiro até Setembro de 2020, o Ministério Público registou 271 casos. Hoje em STP, a violência doméstica afeta mais as mulheres, e muitas crianças que presenceiam este ato, são alvo direto da violência psicológica. A lei sobre a violência doméstica está em pleno vigor, por isso, na mulher não se deve bater nem com um tapa que muitos chamam de “amor”.
A mulher é sempre a vilã da história! Até quando? Mulher, seja ousada para que não sejas vítima amanhã. Não cales! Denuncie! A lei e o Estado te protegem! Todo o ser humano tem o direito de ter uma vida saudável, livre da violência.
Em pleno século XXI, existem mulheres capazes de dizer: “o meu homem bate-me, porque ama-me!” e digo mais, segundo um inquérito que foi realizado em STP em 2014, indica que 19% das mulheres acham normal um homem bater na mulher, quando queima a comida, a roupa, quando saem sem avisar, etc. Muitas dessas mulheres não denunciam, porque dependem financeiramente do seu agressor e não recebem o apoio emocional da família que também não têm para dar. Elas vêem-se obrigadas a cancelar os seus sonhos, seus propósitos e perdem os seus objectivos para viverem este amor doentio, como quem diz: “se te arrancarem de mim, aí sim é o fim do mundo”. A própria família muitas vezes diz: “um bocadinho desse roço só, já foste queixar teu homem, comes o quê?”
Por outro lado, as mulheres são perpetradoras de violência doméstica contra os maridos e tem havido pouca denúncia da parte dos homens, porque a própria sociedade condena este ato, mesmo da parte dos órgãos competentes, há uma fraca capacidade desses para orientar a própria vítima, principalmente os homens. As mulheres podem ser/são tão violentas em casa como os homens, por isso para a resolução desses conflitos, tanto homem como a mulher devem ser tratados da mesma forma.
Por conseguinte, nos últimos tempos, este problema têm afetado também as pessoas de terceira idade, que acabam ficando dependente dos outros membros da família, que depois de tantos anos de amor, dedicação, educação, sacrifício para criar os filhos e tendo em conta o seu estado de fragilidade, os terceiros já não têm paciência e isto leva-os a apelidar os idosos de feiticeiros, criando uma situação de conflito e acabam expulsando os idosos do seio familiar.
Caríssimos, a forma como educamos os nossos filhos, irá garantir que eles possam pensar, agir, posicionar de forma diferente na sociedade!
As famílias são pilares de amor e segurança e na maioria dos casos a violência doméstica contra as mulheres acontece no seio das famílias, pelos parceiros e vice-versa. É preciso percebermos e termos a consciência que as desculpas não curam as marcas do soco, do pontapé, das chapadas, da perda de um olho, etc. porque o “amor que dói, não é Amor!”
Conto-vos uma história de vida fragmentada de dores
Luiza Azevedo, esposa de Luís Mário pareciam ter uma vida perfeita: um emprego, um marido, um filho e uma casa dos sonhos, mas uma sombra e o céu nublado cobriam aquela casa e a Luiza guardava um segredo, o meu marido perfeito, que era visto por todos como um anjo era na verdade um agressor.
Tudo isso começa, quando ele conheceu a Tânia, e consequentemente, as respectivas traições do marido levaram a Luiza a confrontá-lo e como resultado disto, ela foi espancada e foi sofrendo maus tratos físicos, psicológicos e sexual pelo dito “amor da sua vida”. “Ele bate-me, e eu grito pedindo socorro e ele bate ainda mais forte, liga a rádio põe o volume no máximo para ninguém ouvir o meu grito de socorro.” É real!
Na cultura do leve – leve, um dia a Luiza ganhou força para denunciar e hoje partilha a sua história de vida com as outras. “Se não és feliz, tens de sair”.